sábado, 26 de janeiro de 2008

Snow Crash



(Vai a capa da edição americana, que a da edição portuguesa não é muito inspiradora...)

Snow Crash é um livro que não se leva a sério. Mesmo nada a sério. O livro segue as aventuras de Hiro Protagonist (pronuciem o nome do protagonista e percebem a piada), um hacker afro-coreano em luta contra um cartel político-religioso que quer dominar o mundo tendo como arma secreta uma linguagem escrita em sumério capaz de alterar a mente. Snow Crash é o nome do vírus sumério, capaz de apagar a mente de hackers e programadores, que devasta o metaverso.

Com um título muito infeliz em português, Nome de Código: Samurai, Snow Crash parece à partida ser mais uma daquelas histórias que se dizem de ficção científica mas não o são, sendo simples aventuras em cenários futuristas. É à medida que vamos mergulhando no livro que começamos a perceber a verdadeira complexidade do romance. Este não pretende ser mais do que um conto de aventuras; é assumido nisso. O que o destaca é a capacidade de imaginação futurista de Neal Stephenson, o que transformou Snow Crash numa obra de culto da ficção científica cyberpunk.

Parte do romance desenrola-se no Metaverso, um espaço virtual cibernético de avatares que interagem numa rede informática mundial com uma mega cidade como interface visual. Parece familiar? Quase parece estarmos a falar da Internet, do ciberespaço e da realidade virtual. O livro foi escrito antes da explosão da internet - quando as discussões sobre espaços virtuais estavam reduzidas a núcleos duros de teóricos académicos. De certa maneira, Snow Crash inspirou alguns dos conceitos de espaços virtuais, hoje quase banais nos ambientes de jogo multijogador, que chegam a reunir milhares de avatares num único espaço virtual (pensem no Second Life). O que era uma teoria sócio-informática e uma ideia literária transformou-se num rendoso produto económico.

O enredo de Snow Crash que se desenrola no espaço real chega a tocar os limites do surrealismo, embora pareça assustadoramente possível. Influenciado pelas regras de um mercado livre e agressivo, Stephenson descreve um mundo desagregado. A noção de país desapareceu, substituída por míriades de territórios suburbanos controlados por mega-corporações rivais. As forças policiais e militares são privadas, e a ideia de franchising foi levada ao absurdo de até a mafia abrir sucursais legais. O governo apenas controla parcelas de território não franchisadas, funcionando como mais uma corporação. As pessoas vivem e deslocam-se entre condomínios fechados, circulando em auto-estradas rodeadas de lojas franchisadas. Parece uma ideia impossível? Circulem então pela IC-19, ou por qualquer outro espaço suburbano/exurbano contemporâneo.

Snow Crash vale pelo gosto da pura aventura, mas o que transforma este livro numa referência da Ficção Científica de género cyberpunk é o imaginar de um mundo virtual hiperreal que se mescla com um mundo real cada vez mais irreal.

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